Dom Bosco: lembranças de um passado feliz e o futuro incerto - Blima Bracher
Blima Bracher

Dom Bosco: lembranças de um passado feliz e o futuro incerto

Imagem reprodução do Prédio do antigo Colégio Dom Bosco em Cachoeira do Campo: futuro incerto de um dos grandes ícones de Minas Gerais

Lembro-me de passar tardes felizes deitada no gramado do então ativo Colégio Dom Bosco, ícone de Cachoeira do Campo, em Minas Gerais. A Casa de ensino tinha moldes de internato, mas nos fins de semana, mediante uma taxa, era aberta à visitação, o que fazíamos com gosto e amiúde em família. Chupávamos laranjas serra d’água e jabuticabas estirados no gramado, às sombras das árvores. E as tardes eram longas e protegidas pela juventude de meus pais e pela infância que corria em minhas veias e em minha irmã, Larissa. Éramos quatro e nos bastávamos naquele doce sabor de laranjas. Às vezes pensava naqueles que ali estudavam. A construção sólida e imponente me parecia imbatível ao longo dos anos. Quantos sonhos e sentimentos abrigavam aquelas paredes? Alegrias, saudades, choros e amizades. Espectros da alma humana e equações da matemática, poemas, cartas e teoremas, diplomas e axiomas, o terno engomado e os pijamas lavados, estudados nos varais do pátio. A vida passou por ali e inundou corredores, agora vazios, sem vozes, porém ecoando perguntas e ávidos por respostas: o que será do antigo Colégio Dom Bosco? Essa lembranca me veio ao receber o e-mail do querido smigo e colega Mauro Werkema, que muito me orgulha por compartilharmos da mesma alcunha: a de Jornalista . Divido com vocês o texto de Mauro. Destino do Dom Bosco sem definição Por Mauro Werkema Há seis anos permanece indefinido o destino do Dom Bosco, em Cachoeira do Campo, incluindo o antigo quartel do Regimento de Cavalaria do governo colonial e os 520 hectares que o cercam. Em local privilegiado, às margens da Br-356, entre Ouro Preto e Itabirito, continua pertencendo à Ordem Salesiana, que instalou-se em Cachoeira em 1893 após receber terreno e o antigo quartel do então governador, Afonso Penna, com o objetivo de instalar e manter um colégio. Os salesianos cumpriram esta missão por 100 anos mas se viram obrigados a fechar o antigo colégio, famoso como internato, mas com um modelo que não mais se sustenta nos tempos modernos, a exemplo do Colégio do Caraça, também famoso. Educou milhares de alunos e tem muitas histórias ligadas à vida da Colônia, no Império e na República. Os salesianos tentaram uma hospedaria e um local de seminários e reuniões, o que também não deu certo. Decidiram então vender, por R$ 20 milhões, para uma empresa imobiliária de BH, que pretendia implantar um loteamento e que chegou a informar que poderia usar o antigo quartel como hotel. A venda foi impedida pelo Ministério Público Estadual que, por solicitação do Movimento “O Dom Bosco é Nosso”, surgido em Cachoeira do Campo e com apoio de setores ouro-pretanos, ajuizou Ação Civil Pública, pedindo que o patrimônio, quartel e terras, fosse devolvido ao Governo do Estado por descumprimento do objetivo da doação. Alegou que trata-se de edificação histórica que precisava ser preservada e ter destinação cultural ou educacional. Os salesianos ganharam na primeira instância, na Comarca de Ouro Preto, ganharam no Tribunal de Justiça do Estado e tiveram estas sentenças confirmada na instância federal. Neste ínterim, o IEPHA tombou o antigo prédio, reedificado em 1776 pelo governador Dom Antônio de Noronha para ser o quartel do Regimento de Cavalaria da Colônia. Neste Regimento serviu Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, e seu comandante era o também inconfidente tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrade. No Dom Bosco, Dom Pedro I esteve em 1822 e 1831 e dom Pedro II o visitou em 1881, o encontrando quase abandonado e resolveu doá-lo para o Governo do Estado. Por três anos lá funcionou o Colégio Agrícola Cesário Alvim, que também fracassou. Afonso Penna trouxe os salesianos e as Irmãs Auxiliadoras de Maria, que até hoje mantém colégio e hospedaria em Cachoeira. Hoje, o conjunto permanece fechado, em processo de deterioração. A UFOP já manifestou seu interesse para sediar uma incubadora de projetos. A Polícia Militar reconhece que sua origem foi no quartel de Cachoeira e manifestou seu interesse em instalar um museu e outras atividades, inclusive a criação de cavalos, retornando à Coudelaria (criação de cavalos) implantada inicialmente por Dom Pedro I. A Ordem Salesiana permanece em silêncio, nada revelando, até agora, sobre qual destinação poderá dar ao prédio. Ou mesmo se pretende, novamente, tentar vender. Valioso, com localização estratégica, o Dom Bosco e terrenos podem servir para novos empreendimentos. Admite-se que possa servir a iniciativas culturais e educacionais mas também para uma ocupação imobiliária, contida nos amplos terrenos e não exclusiva. Prefeitura de Ouro Preto, UFOP, Polícia Militar e os salesianos poderiam organizar uma reunião e discutir o destino do Dom Bosco, com anuência da comunidade de Cachoeira do Campo. O pior é nada fazer enquanto deteriora-se o patrimônio histórico e fica inútil propriedade tão importante e valiosa, até para a economia regional.

Maurowerkema@uol.com.br

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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William Sacramento

Parabéns pela publicação Blima!
Muito elucidativo para este momento tão delicado do nosso Colégio.

Blima Gomes Bracher

Vamos gritar por nosso Património

Luiz Otávio Figueiredo

Como meu pai eu estudei lá de 1956 a 1960……muita saudade dos bons tempos !!!
Torço para que esta “disputa” tenha um final feliz !!
Obrigado pela publicação……me trouxe ótimas recordações…..parabéns !

Blima Gomes Bracher

Muito muito obrigada pela gentileza !!

JOSE CARLOS VIANA VIANA

Eu tambem sou ex aluno do D. Bosco .
Parabéns pela reportagem…..

NK

Eu estudei no Colégio Salesiano Dom Bosco, em Araxá, MG. Naquele tempo havia educação escolar de qualidade. Mas hoje…nem é bom falar.

Blima Gomes Bracher

Verdade!!!

NK

Obrigado pelo apoio. (NK)

Ronaldo Nunes

Sou ex-aluno do Dom Bosco, em Cachoeira do Campo, de 1964 a 1966. Fico triste de ver o conjunto arquitetônico e todo o espaço de matas sendo esquecido e negligenciado. Se não há interesse dos Salesianos em continuar destinando o patrimônio histórico para os fins que os levaram a receber a doação que ele seja sim vendido, desde que se preserve o belo prédio intocado e restaurado. Que seja até destinado a ser um hotel ou um espaço cultural ativo. Há muitas terras que podem ser destinadas a empreendimentos imobiliários e que sejam regulados por um bom código de obras.

O que não pode é ficar lá com o destino certo à destruição.

Blima Gomes Bracher

Vamos divulgar. Abracos

Helio Eduardo

MINHA GRANDE PAIXÃO! VIVI E ESTUDEI NESSE COLÉGIO POR 3 ANOS. 68, 69 E 1970. AINDA EM MEU CORAÇÃO ASSISTO A ESSA DESTRUIÇÃO COM MUITO PESAR! OBRIGADO “GINÁSIO DOM BOSCO”!

Blima Gomes Bracher

Belas lembranças