Crônicas

Os fantasmas de Werneck, Bracher e Zobaran

Estavam Valentim e o amiguinho Zoba estirados no sofá da sala. A televisão de trocentas polegadas exibia um programa americano, onde caça fantasmas reais, visitam locais supostamente mal assombrados com tecnologia de ponta para detectar possíveis presenças do além.

Tudo muito realista, com direito a sustos e respiração ofegante. A cada passo os dois garotos de nove anos, arregalavam os olhos e estiravam os dedinhos em claro sinal de medo, sem obstante demonstrarem tal fraqueza um para o outro.

Claro que titia (eu), observava tudo achando certa graça naquele desafio de nervos.

Foi quando um terceiro amiguinho chegou. Adentrou a sala, muito sério, com ares de CEO de multinacional, atrás de óculos grossos. – Boa tarde tia, eu sou o Werneck.

Então juntou-se ao grupo e descreveu cientificamente todos os fenômenos sobrenaturais dos tais fantasmas. “Isso são ondas de calor emitidas por algum objeto; aquilo são barulhos causados por algum animal na selva…” E por aí foi.

Zoba ficou encantado e tratou de tirar da mochila seus óculos de grau. “– Também uso”, e, num instante, os óculos que davam certa vergonha ganharam status. Também se virou pra mim e disse: “- Tia , meu nome não é Zoba, é Zobaran”. Meu Deus, de repente estava eu diante de dois mini CEOs de multinacionais, seríssimos, chamando-se pelos sobrenomes e explicando fenômenos sobrenaturais.

Valentim, sem óculos de grau para usar, apenas pediu: “ – Podem me chamar de Bracher.”

Então ficaram Werneck, Zobaran e Bracher.

Eu já me sentia encolhida, diante de tanta pompa. Nada de brincadeiras com aqueles três senhores.

Pois bem, eis que chega a noite e os três vão dormir em casa de Valentim, digo Bracher. O quarto fica bem ao lado do da titia aqui.

Não era meia-noite, quando ouvi baterem na minha porta. Tiric atendeu. Era Bracher, vulgo Valentim. “_ Ei tio, podemos dormir aqui. É que tem uns vultos na nossa janela. Só não conta pra minha mãe e nem pro meu pai. De manhã, vocês passam os colchões pela varanda e eles não vão saber de nada.”

Acomodamos os três nos colchões no chão. Com os olhos arregalados, uns atravessavam os outros nas conversas. “ _ Os vultos eram assim e dançavam”, mostrou Valentim com as mãos. Zobaran confirmou: “_ Sim, os vultos estavam dançando.”

– “Como assim?”, perguntei. Então, Valentim, magrinho como cepa, se levantou e rebolou. “ – Nossa, quer dizer que os fantasmas estavam rebolando na janela?” – “_ Tipo isso, Tia Bebé”.

Jesus, vultos rebolativos na janela e acabaram-se a coragem, as explicações científicas e os ares de durões: eram três meninos acuados, sem óculos e dormindo aos meus pés.

“_ Bom, se rebolavam pelo menos eram animados, deviam estar numa festa”, concluí, fingindo que não sabia que não passavam de reflexos da piscina transformados em sombras nas cortinas esvoaçantes.

Blima Bracher

Blima Bracher é jornalista, formada pela UFMG e Engenheira Civil. Trabalhou doze anos em TV como repórter e apresentadora na Globo e Band Minas. Foi Editora da Revista Encontro e Encontro Gastrô. Escritora, cineasta e cronista premiada.

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