Crônicas

Crônica e o novo destino do Castelinho dos Bracher

Crônica, por Blima Bracher

O Castelinho dos Sonhos

Voltando a um passado menos remoto no Castelinho dos Bracher, me lembrei das noites que dormia no quarto verde e era acordada com o cheiro do cigarro que meu tio fumava escondido no banheiro de baixo. E descia para a cozinha e passávamos a madrugada conversando sobre o sexo dos anjos, sobre o sentido da vida ou, simplesmente, sobre os quitutes da Nicinha.

Aliás, pra mim, as pimentas daquela cozinha serão sempre dela e da Laurinha. Pimentas de macaco. Aqueles pastéis de queijo ou carne ardidos. O picadinho da Nicinha era a única coisa que meu tio comia na semana que antecedeu seu passamento.

E Dona Elza a balangar os peitos como fazia na escola de samba.

E o Bombom roubando cachaça na cozinha.

E a nossa própria Globeleza, a Vãnia, de arquinho e rabinho de gatinha no Carnaval.

E tio Décio murmurando sobre a Amíriam, que por sua vez batia na mesa e saia furiosa.

Pra nós, Ami, sempre preparou ótimas saladas.

E as gargalhadas de Laurinha.

E as visitas do Cassimiro, ao som de três campainhas, sempre esperadas aos domingos.

E os primos de Juiz de Fora e do Rio, que se sentavam ao redor da mesa em rodadas de pizza (isso no tempo das vacas gordas), ou das pipocas, mais modestas, coitadinhas.

E no corredor ainda ecoa a voz de Waldemar, o vovô Brachão. O vulto grande, a chegar de tarde. Com voz grossa e doçura infinita. E ele ao piano, tocando. E trazendo biscoitos de mel ou leitoas assadas nos natais.

Nestas ocasiões, sempre catávamos “Adeste Fidelis” que tio Décio elevava às alturas. E os teatros de Cecília. E Larissa montada nas costas do Bulunga. Tinha Poló, Lucas, Anna Magdalena, Loló e os Gomes.

E os perfumes de tia Shirley. E os tangos de Bebel. E as rosas vermelhas de Max.

E os chás de Hermengarda, nas canecas multicores com gostinho de funcho da horta ao lado. Onde também havia cenouras, que arrancávamos e comíamos sujas de terra.

E as histórias do tio Peri, um cachorrinho preto que teve morto e ressuscitou.

E as caças ao tesouro de tia Nívea.

E tinha o jipe amarelo de Daniel, que ficava no porão.

O abacateiro foi Paulinho quem plantou E ele mesmo andava preocupado com as raízes que abalavam a estrutura da casa.

Esse tio, sempre chega manso, silencioso, com um guarda chuva debaixo do braço, vindo de algum acontecimento social da cidade ou do coral. Sempre uma surpresa alegre, para as conversas na cozinha.

No escritório, gostava de assistir ao Big Brother com tio Décio, que comentava das mais ou menos boazudas.

Da janela do quarto verde, adorava escutar os ensaios de Carnaval fervendo na quadra do Sport.

E ver as luzes desfocadas dos faróis da Getúlio Vargas por traz das folhas do abacateiro.

E sentir o arrepio dos retratos me olhando no andar de cima. E um frio na espinha em alguns lugares da casa. Será bem assobrado o corredor?

Fiquei pensando, onde ficou tudo isso?

Pelo menos, as lembranças de infância, essas ficarão no meu coração.

E ainda existem as luzes da Getúlio Vargas brilhando atrás do abacateiro.

Acima, crônica “O Castelinho dos Sonhos” por Blima Bracher

Com muita felicidade, em nome da família Bracher compartilho aqui no blog, link do Jornal “Tribuna de Minas”, com competente texto do colega Mauro Morais, o qual mostra em detalhes os planos para a transformação do Castelinho dos Bracher, em Juiz de Fora em centro cultural.

Blima Bracher

Blima Bracher é jornalista, formada pela UFMG e Engenheira Civil. Trabalhou doze anos em TV como repórter e apresentadora na Globo e Band Minas. Foi Editora da Revista Encontro e Encontro Gastrô. Escritora, cineasta e cronista premiada.

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