Crônicas

Crítica Oscar 2020: ” O Irlândes”

“O Irlândes” é desses filmes carregados de testosterona, onde o mundo machista da máfia italiana dos anos 60 nos EUA, é desnudado em nuances de diálogos longos, ou sequências de mortes, de certa forma cômicas ao som de música e um festival de charutos cubanos.

Mafiosos italianos são deliciosos tomando sorvetes com a mesma fleuma que “pintam paredes”; dançando valsas sob lustres de cristal; discursando em sindicatos de patrícios; e rodando em cadillacs pretos de couro claro e maçanetas cromadas.

Semiótica pura o corte entre cenas: a carne puxada do caminhão, seguida do bife na mesa; a degola de um galo, seguida do vinho tinto servido; mortes que se passam atrás de flores em vitrines… Lugares comuns que amamos nos filmes de gângsters.

Continua sendo divino ver como funcionam as regras entre els capos davvero. E Martin Scorsese (que concorre ao Oscar de Melhor Direção) passeia bem por este submundo, já explorado em “Os Bons Companheiros”.

Impossível desgrudar os olhos da tela, mesmo em 3h30 no jogo de gato e rato ao longo de vidas que se entrelaçam (destaque para o rejuvenescimento facial dos personagens, já que o filme concorre na categoria Efeitos Visuais).

Um mundo (imundo), que mostra bem como funcionam as coisas: o irlândes (que usa xadrez) contratado pra fazer o serviço sujo, enquanto baixinhos em ternos largos e cabelos engomados (destaque para a indicação de Melhor Figurino) dão as ordens, muitas vezes instruídos pelas mammas, que criam bebês em séries enquanto seus maridos saem para incendiar carros; “moer carne” em máquinas de triturar folhas, ou “pintar paredes”.

Aliás, a trama baseada em fatos reais, é inspirada no livro “I heard you paint houses”, de Charles Brandt e conta a vida de Frank Sheeran (interpretado por Robert de Niro), um irlandês, ex-combatente de guerra, que se envolve com a máfia italiana e se junta ao Capo da facção na Pensilvânia, Russell Bufalino (vivido por Joe Pesci que concorre como Melhor Ator Coadjuvante).

Na trama entra Al Pacino, (que também concorre a Melhor Ator Coadjuvante), como o lendário Jimmy Hoffa, líder sindical, cujo desparecimento em 1975 ainda não foi elucidado.

O filme é costurado e vai lançando dúvidas sutis, como o incômodo dos chefões italianos com o governo dos Kennedys (o crime é mostrado na TV P&B de uma lanchonete); e o nó na garganta pelo governo de Fidel Castro em Cuba.

Soma-se a isso as hilárias cenas da dispensa da coleção de armas no fundo do rio; as mãos frenéticas de Hoffa Pacino; a canalhice velada de Pesci Bufalino; o apresso pelas mulheres (que devem ser escolhidas em famílias conhecidas); e o desprezo pelos gângesters de origem americana, que beiram ao ridículo com seus atrasos em reuniões e bermudas brancas.

Blima Bracher

Blima Bracher é jornalista, formada pela UFMG e Engenheira Civil. Trabalhou doze anos em TV como repórter e apresentadora na Globo e Band Minas. Foi Editora da Revista Encontro e Encontro Gastrô. Escritora, cineasta e cronista premiada.

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