“De Pigmentos e Pedras”
Significativo recorte na sua produção recente resulta em síntese perfeita para introduzir o espectador no universo das pinturas, estandartes, caixas e assemblages. As linguagens se particularizam e se comunicam, evidenciando o fio condutor, que é o sensível diálogo com os materiais da terra e a paisagem.
Murilo Mendes, num pequeno poema em italiano, saudou o reino mineral, “dove il disordine è minimo”. Fani, ao contrário, percebe uma desordem fascinante na convulsiva diversidade das formas e do cromatismo. Interessa-se pela caleidoscópica variação da pedra ao pó, tal como são achados na natureza. Uma possível ordem é estabelecida pelo garimpo dos pigmentos, visando a fusão de que sairá a matéria da criação. As cores se definem, plenas de vitalidade, e se apresentam ao público na condição de primeiro movimento do processo da arte. É a partir dos pigmentos que olhar e gesto da artista entram em sinergia para que a obra se instaure, na pintura ou nas caixas.
O tema da paisagem montanhosa, com a presença constante das nuvens, domina a pintura, enquanto a apropriação dos materiais permite que uma instalação se contenha no contexto das caixas. A nuvem é uma forma em colóquio com a montanha, e seus volumes, densos e silentes, rondam as curvas da orografia. A montanha é a suspensão do pó recolhido nos caminhos de terra colorida, evocando os rasgos sangrentos das vossorocas ou a pálida devastação das queimadas ou a misteriosa fusão das sombras no dorso das elevações.
Paisagens de mistério e silêncio parecem buscar a origem da terra e da arte. Um documentário fotográfico mostra a artista andando no leito de um córrego, a coletar pedras de rio, pouco depois a colher areia e terra nas margens e encostas. Os pigmentos e seixos atuam intensamente na obra de arte. Com eles, Fani toca o chão de enigmas sobre os quais desde o princípio caminhamos. E nos faz ver que arte é transcendência.
Crítica de Angelo Oswaldo de Araújo Santos
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