Dia desses vendo um belo rapaz de óculos pretos me lembrei de um outro que me surpreendia sempre pelas ruas escuras de Ouro Preto, quando eu me julgava sozinha com meus pensamentos.
Aquele rapaz do passado me olhava de um jeito que nenhum outro me olhou: um misto de irmão e amigo… E lá no fundo, um desejo latente de namorado, que nunca se concretizou.
E me feriu no peito uma saudade tão profunda e fria, que eu já julgava conformada.
Não só dele, mas da época. Daqueles tempos. Aulas de teatro…
Gargalhadas juvenis, atropeladas.
Alegria soluçada. O riso sincero, despreocupado.
O ar invadia os pulmões, sem tropeçar em suspiros.
A vida tinha gosto de sonhos com canela e açúcar.
E o tempo era todo nosso como o recheio de bolo que escorre nos cantos da boca.
Hoje não amargo mais nada. Nem azedo, nem doce.
Caminho insípida pelas ruas de Ouro Preto, sem óculos pretos para me surpreender. E no passado ficaram aqueles olhos miúdos, que se fechavam ao sorrir.
Estou cansada das ladeiras históricas.
Porque até uma filha do berço da Inconfidência se cansa.
Me desculpa, Tiradentes, mas hoje, queria caminhar pelas ruas elegantes da Recoleta em Buenos Ayres. E viver como uma portenha. Com casacos pretos e meias finas. E dançar milongas sob a lua prata. E me misturar aos cabelos negros e suas gravatas. E me recolher aos edifícios finos de mármore e torneiras douradas. E elevadores de pantanas, ao som de Gardel, e rosas na janela.
Ou ainda viver na capital paulista e descobrir boates e inferninhos cools atrás de garagens grafitadas e portões de ferro. E comer massas da mamma e me embriagar de vinho da casa. E sair sem rumo, até entrar num mercadinho e sentir o cheiro de fruta madura invadindo meus pulmões entupidos de poluição.
E meu desejo eterno de ser Dona Flor e virar baiana no Pelô. Teria uma casa de muitas cores. E móveis de madeira antigos, cobertos com rendas de bilro. Faria moqueca de siri catado e acarajé. Teria um altar pra Iemanjá, Janaína, a rainha do mar. Às terças iria rezar a missa conga na Igreja do Rosário dos Pretos. E viraria pipoca no Olodum. Depois sairia de bicicleta pelo interior da Bahia, tendo apenas a sombra dos coqueiros como companhia.
Foto: Ricardo Correia de Araújo
Texto:
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.
Lindo texto!!!
Obrigada, querida. Um elogio vindo de uma pessoa tão culta e preparada me emociona.
Muito legal o texto! O “caminho insípida” foi inspirador.
Obrigada pelo carinho.
Lindo!! Parabéns…escreveu com a alma…
Verdade. Em lágrimas.Obrigadà.
nossa, pq nao procura esse rapaz de OP? ah…nao deixo isso passar batido nem a pau! pague pra ver. Coragem. Ferramentas tecnologicas para acha-lo nao faltam.
…”A vida tinha gosto de sonhos com canela e açúcar.
E o tempo era todo nosso como o recheio de bolo que escorre nos cantos da boca.”…
Tradução impar daquilo que implode, depois explode, enfim eclode como uma flor em uma primavera feliz, bem aqui, no ladinho esquerdo.
Merejam- se os olhos, procuro os óculos, na vista cansada a lembrança elevada.
Obrigado!
Você foi muito feliz em sua crônica. Quão belas escritas…
Fico feliz com seu elogio. Obrigada!
Lindo e envolvente texto! Parabéns!
Obrigada
Muito obrigada!!!
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Eu já provoquei alguns amores avassaladores desses e me vi em difíceis situações quando jovens donzelas me perseguiam afoitados pelas ruas de Tiradentes. Mas no Largo das Forras eu ia a forra.
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Tiradentes lutou contra a derrama de impostos mas desde o feudalismo que existe uma turminha de nobres e atualmente mais que todos os tempos querem viver seus luxos usufruindo do trabalho de muitos e essa turminha hoje denominada de políticos. Os demais que vivem de luxo sem trabalhar buscam ganhar nas redes sociais mas até quando todos no computador e o trabalho de produção de alimentos, e coisas necessárias à sobrevivência fica aonde? Não à toa os cientistas preveem um colapso na humanidade daqui a 40 anos.